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  • Paulo Autran, 50 anos de palco

    Às vésperas de completar meio século de atividade teatral, o ator Paulo Autran volta aos palcos com a peça O Crime do Dr. Alvarenga, de Oswaldo Rasi reinterpretada pelo filho Mauro Rasi. Em entrevista exclusiva para a revista Churrascaria, Paulo Autran conta um pouco sobre sua carreira, a aversão pela televisão e a emoção renovada a cada novo trabalho que realiza.

    Dizer que Paulo Autran é um dos melhores atores ou o melhor ator brasileiro em atividade é redundância. Já há algum tempo o seu nome é sinônimo de excelência na arte de representar. Agora, prestes a comemorar cinqüenta anos de carreira no final do ano, Paulo Autran está no palco com a peça O Crime do Dr. Alvarenga, um texto de Oswaldo Rasi, “investigado pelo seu filho Mauro Rasi”. Nesta entrevista Autran fala sobre o seu meio século de teatro, sua participação no cinema e na televisão, além do prazer de continuar representando pelos palcos do Brasil.

    Churrascarias - O senhor que tem cinqüenta anos de experiência teatral, como vê a evolução ou, digamos, o percurso da arte de representar no Brasil durante todo esse o tempo?

    Paulo Autran - O teatro é uma arte que está em evolução constante, não cristalizando nunca. Ele está sempre se modificando e a crise teatral só tem feito com que melhore cada vez mais. As pessoas saudosistas, por exemplo, dizem que “teatro era só no tempo do TBC (Teatro Brasileiro de Comédia)”, mas não é verdade. Depois do TBC se fizeram espetáculos deslumbrantes, maravilhosos, que encantaram não só o Brasil como o mundo inteiro. Nesses cinqüenta anos, que vou completar agora em dezembro, vi que o teatro está sempre se modificando, ele só não pode ficar parado.

    Nesses cinqüenta anos quais foram as melhores lembranças que o senhor guarda?

    P. A. – Foram tantas lembranças... Estreei oitenta peças, sendo que cada uma delas me deu uma emoção diferente e maravilhosa. Várias, felizmente, fizeram muito sucesso, então tenho recordações muito bonitas da minha carreira inteira e espero ter ainda muitas mais.

    O senhor participou do filme Terra em Transe (1965) do Glauber Rocha que, se estivesse vivo, estaria comemorando sessenta anos de idade. Quais as lembranças ou bons momentos que o senhor guarda desse filme?

    P. A. – Em Terra em Transe o Glauber estava no auge da sua ebulição intelectual. Ele era um homem brilhante e divertido. Um gênio do cinema que fez um script, filmou outra coisa e quando montou estava completamente diferente. E cada vez melhor. As filmagens foram muito agradáveis e, quando paravam, a prosa com Glauber também era sempre interessante. Adorei fazer o filme.

    O senhor também participou de O País dos Tenentes (1987), do João Batista de Andrade, não?

    P. A. – Participei e gostei também muito de fazer. Um script muito inteligente do João Batista, que é um doce de pessoa, um excelente diretor. Foi uma filmagem muito agradável. Depois disso fiz vários outros filmes. Recentemente participei da cena final do Tiradentes, do Oswaldo Caldeira, fiz o Oriundi, com o Anthony Quinn em Curitiba, e fiz O Enfermeiro, que é um filme lindo, um conto do Machado de Assis, com direção do Mauro Farias. Foi levado uma vez no Telecine. Agora eles estão tentando arrumar patrocínio para filmar outro conto do Machado de Assis, emendando com O Enfermeiro, formando um longa, porque ele só tem quarenta e poucos minutos, não dá para exibir nos cinemas.

    O senhor é um dos grandes intérpretes de Molière e de Shakeaspeare. Há algum personagem desse dois autores clássicos do teatro que o senhor não representou e gostaria de ter feito?

    P. A. - O teatro é uma arte abençoada, porque em qualquer idade você tem sempre inúmeros papéis e personagens para fazer. Há muita coisa que ainda não fiz e gostaria de fazer do Molière e mesmo do Shakeaspeare, como Timon de Atenas.

    A indicação de Fernanda Montenegro para o Oscar, como melhor atriz, contribuiu em alguma medida para os outros atores brasileiros?

    P. A. – Todos nós ficamos muito alegres, honrados e orgulhosos de ter uma atriz brasileira junto com nomes internacionais. Pena que ela não ganhou, mas só o fato de ter sido candidata já foi uma alegria muito grande para todos nós que fazemos teatro.

    Sobre esse seu novo trabalho, O Crime do Dr. Alvarenga, o que o senhor tem a dizer?

    P. A. – É uma peça divertida. Nós já fizemos uma temporada em Bauru, que é a terra do autor, e foi um sucesso estrondoso com o público se divertindo muito. Também estivemos no Festival de Teatro de Curitiba e mais de 2.000 pessoas lotaram o Guairão. Acredito que a peça está destinada a fazer uma longa carreira. A platéia que assistir vai se divertir muito.

    Como o senhor caracteriza os seus personagens em O Crime do Dr. Alvarenga?

    P. A. - Na peça eu faço dois personagens: o pai do Mauro Rasi, que é o Vado, tendo um relacionamento familiar muito divertido. Faço também, no meio da peça, o Dr. Alvarenga em umas cenas que o pai do Mauro escreveu na década de cinqüenta, com uma linguagem toda rebuscada e muito divertida para os ouvidos de hoje.

    O que o senhor mais gosta de fazer na televisão: novelas ou seriados, como Hilda Furacão, no qual participou recentemente?

    P. A. – Nem de seriado e nem de novela, eu gosto de fazer teatro. Aceitei participar do Hilda Furacão porque me garantiram que seria só três meses de gravação e meu papel era pequeno. Resultado: seis meses gravando aquilo. Mas achei a mini-série muito bonita e bem dirigida. É verdade que só assisti dois capítulos, porque há cinco anos que não assisto televisão. Depois participei de um Você Decide, que as pessoas gostaram e que eu não assisti. Mas acho muito chato fazer televisão.

    Já que falamos em televisão, o que o senhor acha desses programas popularescos como Ratinho ou Leão Livre, que exploram o mundo cão?

    P. A. – As televisões comerciais brasileiras têm como ideal descobrir qual é o gosto médio da população, baixando cada vez mais esse gosto médio. E o pior é que essas coisas fazem sucesso. Seria preciso que Governo exigisse que os programas tivessem um melhor nível, pois, apesar de serem empresas particulares, os canais são uma concessão pública.

    Em dezembro o senhor completa cinqüenta de interpretação. Alguma comemoração especial para essa data?

    P. A. – No dia 13 de dezembro completo cinqüenta anos, mas não estou pensando em nada. Por enquanto...

    Texto originalmente publicado na revista Churrasco & Churrascarias, maio/junho de 1999, pp. 34/8.