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  • Renato Aragão, santo trapalhão

    Um certo dia, o compositor e cantor Caetano Veloso disse em uma de suas canções que Renato Aragão era um “santo trapalhão”. Licenças poéticas à parte, o humorista Renato Aragão está longe de ser canonizado, mas apesar de não ter realizado nenhum milagre, seguramente tem como crédito no céu uma façanha: seu personagem Didi, junto com os atrapalhados Dedé, Mussum e Zacarias, foi responsável pela alegria de inúmeras gerações de brasileiros. Todos os domingos, ao final da tarde, esse cearense de Sobral, formado em Direito pela Universidade do Estado do Ceará, comandava o riso solto e fácil de toda a garotada com gags, piadas, ditos e caretas. Foram vários anos de sucesso, até que a morte de Mussum e Zacarias pôs fim ao quarteto Os Trapalhões. Atualmente, Renato Aragão diverte os seus fãs, com outra trupe, no Didi e Sua Turma, pela Rede Globo. Nesse novo programa participam os atores André Segatti, Vanessa Bueno, Débora Lagranha e Elieser Motta, que dividem com ele o palco no show também chamado Didi e sua Turma, um espetáculo baseado em um CD homônimo, lançado pela Indie Records. Em entrevista exclusiva para Churrasco & Churrascarias, Renato conta sobre esse novo disco, seu trabalho como embaixador da Unicef e seu novo filme que estreará na metade do ano que vem.

    CHURRASCO & CHURRASCARIAS - Renato Aragão é um dos melhores humoristas brasileiros e agora está lançando o CD Didi & sua Turma. Você se considera um cantor?

    RENATO ARAGÃO - É bom você falar isso, é ótimo... (risos). É a primeira vez que estou sendo chamado de cantor. Faço uma brincadeira, uma música engraçada. Não é minha praia ser cantor, mas para fazer um CD para as crianças a gente dá um jeitinho.

    C & C - Como foi a participação da Ivete Sangalo no disco?

    R. A. - A Ivete Sangalo primeiro participou de um filme nosso chamado “Simão, o fantasma trapalhão” e daí nós ficamos amigos. Quando fomos fazer o disco vi que tinha de colocar um convidado de peso, e pensei: “Vou chamar uns amigos para o sacrifício”. Ligamos para ela que aceitou na mesma hora. Em quinze minutos ela colocou a voz na música “Todo mundo deve ser mais criança”. O que a gente leva três dias para fazer a Ivete resolveu em trinta minutos.

    C & C - O que o público pode esperar do seu novo show?

    R. A. - Muita alegria. Esse show para mim é um desafio, pois é a primeira vez que faço este tipo de espetáculo. Nele estão envolvidos artistas circenses, música, emoção, magia, humor, festa e lutas. É uma historinha costurada pelos musicais e dirigida pelo Jorge Fernando, um cara que entende disso. O espetáculo é um circo de acrílico no palco, como se fosse uma mini Las Vegas, e tem uma produção muito bonita e honesta.

    C. & C. - Há várias décadas, Os Trapalhões têm divertido milhares de crianças brasileiras. O que representa isso para você?

    R. A. - Foi uma época de ouro, um tempo que passou com muitas vitórias, muitas marcas de humor, muita alegria dos companheiros. A perda de dois colegas (Mussum e Zacarias) foi uma fatalidade, e a gente não pode ir contra isso. Parei e não queria mais fazer absolutamente nada na minha carreira. Mas eu não pude me acomodar muito tempo. Agora estou com uma proposta nova, gente nova, um outro tipo de trabalho. Aquela foi uma época áurea, agora estou tentando fazer outra fase.

    C & C - Você é embaixador da Unicef. Fale um pouco sobre este trabalho dedicado à infância.

    R. A. - É um título que a Unicef dá para as pessoas que se dedicam às crianças. A minha função é aplaudir os bons exemplos, além de cobrar os governantes para saber o que estão fazendo pelas crianças. Também devemos movimentar a sociedade, alertando sobre os problemas da infância. Estou fazendo a minha parte.

    C & C - E por falar em infância, como foi a sua infância no Ceará?

    R. A. - Foi ótima. Tive uma infância maravilhosa, não posso me queixar. Nunca tive dificuldades. Meu pai tinha muitas coisas e, sempre que pude, também fui um bom filho.

    C & C - Como tem sido a sua participação no especial Criança Esperança?

    R. A. - Faço o papel de mestre de cerimônias. A função do Criança Esperança, não é só arrecadar fundos. São importantes aquelas doações, mas não resolvem o problema. O importante do Criança Esperança, o que eu sempre cito, é que ele deixa uma poeira de solidariedade tão grande que, depois de mostrar aqueles problemas, esfregando na cara que a criança está abandonada, no sentido figurado, nascem organizações não governamentais e as pessoas começam a se movimentar. Mas de repente passa aquele calor, todo mundo esfria e temos que recomeçar tudo de novo, porém sempre deixa uma poeira de solidariedade.

    C & C - Você é um dos recordistas em bilheteria do cinema brasileiro. Quais são seus novos planos nessa área?

    R. A. - Para julho do ano que vem estou preparando o roteiro de um filme novo chamado Cupido Trapalhão, baseado na história de Romeu e Julieta. Mas ainda não tem elenco, não tem nada, só tem a sinopse.

    C & C. - Por falar em cinema, como é ser dirigido pelo próprio filho?

    R. A. - Muita preocupação. Meu filho é uma pessoa que nasceu dentro do cinema. Ele é formado em cinema pela PUC-RJ. Só que isso não quer dizer nada porque cinema não se aprende na escola, mas ele tem muita prática disso. Eu fiquei meio preocupado no primeiro filme, que foi o Simão, mas o moleque mostrou que sabe e foi uma das maiores bilheterias. Aí eu fiquei tranqüilo, na verdade quando eu vi os primeiros takes, já fiquei mais seguro.

    C & C - Você às vezes faz alguns takes com um humor bastante refinado, que são totalmente mudos. Você acha que o público brasileiro está propício a receber esse tipo de humor? Ou estão muito acostumados a ver o Renato Aragão somente como o Didi?

    R. A. Esse tipo de humor, na velocidade em que está a televisão, não funciona muito se você colocar sempre. Ele tem o seu ponto de colocação, entra um pouquinho, assim como uma citação do Chaplin, que foi quem criou isso. Depois você sai fora, senão fica enfadonho. Porque é um humor muito lento e hoje, com a televisão com uma série de informações, o humor fica muito veloz e você não pode fazer o que fazia antigamente. O seu estilo pode continuar, mas o tipo de piada, o tipo de gag, tem de estar numa velocidade muito grande, ou então num siticom, numa comédia, senão não resiste. Hoje em dia a gente tem que acompanhar a modernidade.

    C. & C. - O que o Renato Aragão e o Didi têm em comum?

    R. A. - Nada, absolutamente nada. O Didi é um irreverente, um irresponsável. O Renato Aragão procura ser responsável, um bom pai, uma pessoa que dá exemplo dentro do possível, fazendo sua parte na sociedade. Mas como o Renato Aragão é tímido demais, ele tem esse tipo de problema, então ele construiu o Didi como um alter-ego em quem descarrega tudo o que não pode fazer.

    Texto originalmente publicado em Churrasco & Churrascarias , setembro/outubro de 2000, pp.16/8.